Plataforma de Compartilhamento ou Instrumento de Subordinação? (Parte II)

O Direito não é uma ciência exata.

Naturalmente é uma ciência Humana e daí qualquer demanda submetida a sua apreciação pode levar a respostas que aparentemente são antagônicas, mas que uma análise mais detida, demonstra que não o são.

Nas ciências exatas são tratados os temas de variáveis predeterminadas que conduzem sempre as mesmas “respostas” a partir das mesmas “perguntas”.

No caso do Direito a realidade é outra uma vez que na sua aplicação exige a hermenêutica que já impõe que o operador do Direito não simplesmente “aplique” uma regra, mas interprete o texto da lei antes de entender qual a regra compreendida na norma.

Mesmo quando o texto legal não impõe dificuldades hermenêuticas para se chegar a norma aplicável, a aplicação depende de vários fatores extrínsecos à norma, como os fatos narrados e provas apresentadas e, uma questão muito delicada, a não neutralidade do juiz. Sim, o juiz deve ser imparcial, mas a neutralidade suporia que o juiz não possui valores (crenças) e que não os considerasse durante todo o processo hermenêutico e de subsunção do caso concreto à norma.

Sendo assim, na ciência do Direito não existem “verdades” absolutas, mas sim, a “verdade” do caso considerando a norma aplicável, os fatos narrados e as provas apresentadas.

Pois bem, a questão da UBER relativo ao vínculo empregatício entre a Empresa e o Motorista, como bem colocamos no primeiro texto sob o mesmo título, gerou uma sentença no sentido de determinar pela existência do vínculo e consequente anotação na CTPS e pagamentos de verbas devidas.

Em sentido contrário, exemplifico dois casos:

Em decisão prolatada em 30/01/2017 pela 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte – MG, na fundamentação da sentença, o juiz relata que

“o autor revelou que, em vídeo que lhe foi exibido pela Uber do Brasil, no procedimento de contratação entre as partes, ficou claro que havia modos de comportamento recomendáveis para com o cliente, mas não obrigatórios. Esses modos de comportamento, entretanto, lhe ajudariam a obter avaliação positiva por parte do cliente” (grifo nosso).

Já em decisão prolatada em 18/04/2017 pela Vara do Trabalho do Gama – DF, em sua fundamentação o juiz assim se pronuncia:

“Saliente-se que não há prova de ordens, submissão a horários, punições ou qualquer elemento de prova que denote subordinação, conforme se depreende do depoimento prestado pelo próprio reclamante, considerando que este poderia ficar com o aplicativo desligado e trabalhar quando lhe fosse conveniente, sem que os referidos fatos pudessem causar punições, situações típicas das relações de emprego”. (grifo nosso)

Pois bem, o que se infere é que não existe um “carimbo” a ser aplicado nos Tribunais com respeito a relação de emprego entre o Motorista e a UBER.

Note-se que todas as decisões prolatadas (favoráveis ou contrárias) basearam-se nas mesmas normas expressas nos caputs dos artigos 2º e 3º da CLT que, registre-se, não sofreram qualquer alteração no atual substitutivo do PL 6787-2016 que propõem a “Reforma Trabalhista” do texto legal da CLT.

As decisões surgiram de questão de valoração dos magistrados, e de forma marcante, das

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especificidades de cada caso concreto: como foram narrados os fatos e produzidas as provas.

Quando da decisão favorável (ao Motorista) não faltaram declarações inflamadas que tal decisão “acabaria com o Direito Digital, com a economia compartilhada e com o negócio da UBER”.

Não tenho dúvidas que as oportunidades de negócios encontram-se em área “cinzentas” do Direito, uma vez que propõem condutas/relações e soluções inovadoras e que certamente irão gerar controvérsias a respeito de como realizar a adequada interpretação da norma (hermenêutica) para essa nova situação. Isso está compreendido na dinâmica das relações humanas e, portanto; na dinâmica do Direito.

Em todo esse contexto de estabilização de entendimentos destaco a atuação essencial do Advogado como sua capacitação técnica de condução dessas questões de forma e possibilitar a convicção do magistrado em um ou outro sentido. E naturalmente, conduzir a discussão aos Tribunais Superiores para revisão/confirmação das decisões da instância inicial.

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